Maternidade
pode mudar relação de mulheres com suas mães
Chegamos ao mundo extremamente dependentes. Levamos muito tempo
para controlar nossos movimentos a ponto de nos tornarmos capazes de
sobreviver. Precisamos de meses para caminhar, para nos comunicarmos, para nos
protegermos ou nos alimentarmos sozinhos. Quis a natureza, para que pudéssemos
desenvolver mais capacidades, que nosso cérebro continuasse a amadurecer após o nascimento , o que nos
torna uma espécie muito evoluída, mas paradoxalmente muito dependente ao
nascer.
Dessa forma, a presença de um adulto que nos proporcione todos os
aprendizados do início da vida não é só romanticamente desejável, mas
fundamental para a sobrevivência. Em nossa sociedade esse papel é assumido
prioritariamente pela mãe, fato mais que justificável, já que é no corpo dela
que somos gerados. E apesar dos pais estarem cada vez mais presentes no início
da vida, é geralmente a mãe o primeiro adulto que nos dá colo, afeto, carinho e
cuidados. É por isso que nossa relação com ela, ou a ausência dela, nos marca
profunda e intensamente.
No início da vida, à medida que passamos a compreender um
pouquinho a existência, vivemos uma fase linda de adoração desse ser que nos
parece perfeito. Mesmo quem tem uma mãe ausente, também pode criar uma fantasia
positiva dela. Exaltamos todas suas qualidades, sua disponibilidade para nós e
seus cuidados. A mãe é a nossa salvadora, a que nos deu condição de estarmos
vivos. Também pode ser comum acharmos que ela é linda, perfeita, e que está
sempre certa. E com o passar dos anos tendemos a transitar entre duas reações
extremas: estender ao máximo essa relação de dependência ou nos rebelarmos e
fazermos de tudo para sermos autossuficientes.
COMO ENXERGAMOS
NOSSAS MÃES AO LONGO DA VIDA?
As filhas "rebeldes" passam a ter cada vez mais
autonomia e na adolescência já são capazes de tomar conta do próprio corpo, da
alimentação, e gostam de pensar que são totalmente independentes. E nessa fase
podem ficar bem críticas em relação àquela que antes era admirada e protegida.
Já as filhas mais dependentes se recusam a crescer e demoram muito para se
sentirem capazes de assumir a maternidade. Preferem se comportar eternamente
como filhas e rejeitam a ideia de um dia serem mães seguras e independentes.
Em qualquer um dos grupos e quaisquer que sejam as características
daquela que nos criou, pensamos que a forma de nossas mães exercerem a
maternidade nunca está certa. Se a mãe é muito disciplinadora, idealizamos uma
mãe companheira e compreensiva. Se ela é amiga e aberta ao diálogo, queremos
uma mãe que não se confunda conosco e que não seja lembrada ou requisitada por
nossos amigos. Sem consciência de que preparar-se para a vida vai além de
sobreviver fisicamente - já que também envolve aspectos psicológicos, mentais e
emocionais que requerem muito amadurecimento - é natural que a filha se
contraponha, critique e se distancie. Na verdade, ela está procurando seu
próprio caminho, seu próprio jeito de ser mulher e de, no futuro, ser mãe.
O DESAFIO DA
MATERNIDADE
Então a vida caminha e surge o momento que essa filha se torna
mãe. E tenha ela se preparado ou não, esteja pronta ou não, a maternidade será
sempre um grande desafio. Porque então chega o momento que nos deparamos com a
possibilidade de corrigir tudo aquilo que julgávamos "errado" na
maneira de ser de nossas mães. E é quando descobrimos que as decisões que
envolvem a maternidade não são nada fáceis.
Ser mãe é muitas vezes exigir demais de si e se sobrecarregar de
culpas extremas. Queremos acertar sempre, não errar jamais e temos a pretensão
de que existem respostas certas e absolutas quando se trata da criação de
filhos. Queremos acreditar nisso e também nos nossos próprios
"superpoderes".
Mas quando nos deparamos com a realidade de que somos limitados
mortais em nosso caminho de evolução é que finalmente olhamos para nossa mãe
com outro olhar. Porque aí não podemos mais fingir que ela ainda é a
"super mulher" ou a "super vilã". Temos que olhar pra um
ser humano cheio de virtudes e falhas, cheio de certezas e de contradições e
enxergar alguém que um dia se permitiu errar. E é justamente por esse motivo
que estamos aqui. Então o olhar da filha volta a se enternecer diante daquela
figura que, independente de erros e acertos, correu riscos e nos trouxe ao
mundo.
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