PAI GAY
(*) Kátia Horpaczky
Podemos começar com a compreensão de
que o homem é um ser construído histórico e, socialmente, é importante
salientar que a atual crise masculina é resultado de várias transformações
históricas. Ao observarmos a sexualidade
humana, principalmente a masculina, percebemos que a masculinidade é concebida
a partir da capacidade produtiva, pela qual o homem responde como provedor
material e financeiro.
Entre várias formas de demonstração de
poder, destacamos a conquista do status social conquistado pela profissão que o
homem desempenha e pela condição financeira que alcança. Outro fator é a
constituição de uma família que, apesar de não ser mais tão caracterizada pelo
tradicional “pai e mãe unidos pelos laços do matrimônio até que a morte os
separe”, ainda se forma pela presença de um pai provedor financeiramente.
O homem sofre forte cobrança. Existe a
expectativa de que ele jamais fuja às normas e regras ditadas pela sociedade.
Essa pressão leva muitos homens a camuflarem sua verdadeira orientação sexual.
Eles sufocam e reprimem até que fique esquecido seu verdadeiro desejo.
Um aspecto muito importante para o
fortalecimento da identidade masculina está a posição heterossexual, onde
segundo Badinter o padrão de “normalidade” estabelece que "a identidade
masculina está associada ao fato de possuir, tomar, penetrar, dominar e se
afirmar, se necessário pela força" (Badinter, 1993). A homossexualidade,
entendida enquanto dominação do homem pelo próprio homem, se constitui em um
modelo fora do padrão.
Um novo modelo
Nesse cenário de conflito masculino e
conquistas femininas, muitas instituições estão sendo transformadas,
principalmente a família. Ao desviar do modelo tradicional ela assume um modelo
chamado moderno em que "a família hierárquica com papéis bem definidos
quanto a gênero e geração" é substituída.
O novo modelo oferece "uma
família igualitária, onde os papéis e atribuições de gênero e geração estariam
com seus contornos cada vez mais diluídos" (Vaitsman, 1994). É nesse mesmo
momento que se percebe o aumento do número de pais separados e mães solteiras e
a presença de casais homossexuais que, ao desenvolverem suas atividades
profissionais, assumem a responsabilidade de criar filhos fora do padrão
tradicional.
A família gay é um modelo que
atualmente ganha maior visibilidade. O espaço aberto pelas novas formas de
constituição familiar, as várias opções de produção independente, bem como a
alternativa de adoção por parte de pessoas solteiras possibilita que homens e
mulheres homossexuais assumam a maternidade e a paternidade conforme seus
ideais.
Essa “nova família”
acentuou a polêmica sobre os princípios morais que serão usados para educar uma
criança dentro dessa relação. Como ela irá compreender sua família constituída
por dois homens ou duas mulheres, quando a tradicional é representada por um
homem e uma mulher? As respostas estão surgindo a partir de experiências bem
sucedidas. Casais gays educam suas crianças e proporcionam a elas um ambiente
tão saudável, ou melhor, do que os oferecidos por vários casais heterossexuais.
Homossexuais e os filhos
Quanto aos aspectos teóricos que
fundamentam esta problemática, observam-se discussões, como por exemplo, a do
psicanalista Acyr Maia, autor do livro Psicologia e Homossexualidade.
Nele, o autor afirma que nada impede que casais homossexuais eduquem com
sucesso uma criança, pois "de acordo com a psicanálise, a função materna e
paterna são exercidas pela linguagem. (...) Mas qualquer pessoa, independente
do sexo biológico pode suprir essa carência" (Maia apud Mazzaro, 1998).
Entretanto, o maior problema a ser
enfrentado por essas crianças constitui-se na agressão social. Essas crianças
farão parte de um modelo familiar que foge ao padrão de 'normalidade' e poderão
servir de alvo para piadas e brincadeiras desagradáveis por parte daqueles que
se consideram “normais”.
As uniões heterossexuais que evoluem
para a paternidade são exemplos clássicos. Elas cumprem duas regras da
masculinidade. O homem atinge um patamar em que seu potencial viril não poderá
ser questionado. Caso seja questionado, ele apresenta provas concretas de sua
eficiência masculina: a
mulher e o filho, fruto dessa relação.
Ao assumir uma maneira de ser e de
viver diferente da que realmente deseja, esse homem passa a viver esse desejo
na clandestinidade. Ele irá satisfazer suas fantasias e desejos sexuais
carregados por um complexo de culpa e traição, envoltos em um mundo de mistério
que jamais deve ser revelado a sociedade machista. Essa revelação acarretaria
na segregação e os filhos teriam de enfrentar a realidade de que "papai é
gay".
Viver fora deste padrão exigido pela
sociedade é uma decisão muito difícil. É uma opção que vai exigir muita
determinação e coragem já que toda “quebra” traz como conseqüência punições que
vêm sob a forma de preconceito, segregação e da marginalidade de todas as
pessoas que assim ousam viver suas vidas.
Assumir a homossexualidade nesse
universo machista e conservador é percorrer um caminho de muitas pedras e
barreiras. Obstáculos que só serão superados a partir de muitas lutas,
posicionamentos e reivindicações pela busca de uma cidadania plena em que a
orientação sexual não seja motivo de segregação dentro do processo da dinâmica
familiar e social.
Conheça a opinião de um pai homossexual
e sua filha biológica. Nesse caso, não houve conflitos. Os nomes foram omitidos
para preservar a identidade dos envolvidos.
Pai:
1)
Quando
você casou já estava clara sua orientação sexual? Por que casou? Comente um
pouco sobre isso.
Não tinha a menor idéia. Sempre fui absolutamente heterossexual, sem nenhum
interesse por homens. Acho que aconteceu em um momento de solidão. Hoje continuo a me relacionar com mulheres ou com homens sem nenhum problema. Não acredito muito em "rótulos”; acho que amor e sexo acontecem baseados na
química, cheiro e toque, a que chamamos de tesão. Sei lá, tentei entender,
quando aconteceu, mas desisti ao verificar que sou feliz como eu sou....
2)
Houve
um fator decisivo que fez com que você revelasse ao (s) seu (s)
filho(s) sua homossexualidade?
filho(s) sua homossexualidade?
A decisão de morar com um homem e não querer que meus filhos soubessem disso como uma "fofoca" de pessoas alheias ao meio familiar fez com que eu contasse a eles.
3) Em algum momento teve receio de que eles poderiam não entendê-lo?
Interessante é que esta idéia nunca me cruzou a cabeça; sempre tivemos uma
relação aberta, pelo menos é o que penso, e achei que eles me aceitavam pelo
o que eu era para eles e não pela minha eventual opção sexual....
4) Como é sua relação hoje com seu (s) filho (s)? O que mudou? E com sua
ex-esposa?
Do meu ponto de vista, a relação é franca, carinhosa, amigável e, acima de tudo, aberta, sem segredos. Minha ex-esposa, aparentemente, não ficou perturbada. Foi interessante o comentário dela sobre isso. Ela disse:
"prefiro que seja com um homem do que com outra mulher"....
5) O que você gostaria de dizer para pais homossexuais que ainda não se
"assumiram" e ainda não contaram para os filhos?
Claro que existem graus de situações baseados nas idades dos filhos e na
relação com as mães. Eu tive a sorte de ter filhos já crescidos e uma relação saudável com a mãe deles, mas criem coragem. Se os filhos respeitam e amam os pais, seguramente, saberão entender o que acontece. Ninguém consegue ser feliz numa vida dupla e "camuflada".
7) O que você diria para filhos de pais gays?
Amem e respeitem seu pais da mesma maneira que são amados e respeitados por
eles. A vida é feita de equilíbrio e reciprocidade.
Filha:
1) Quando e como o seu pai contou que era gay?
Eu e meus irmãos já havíamos desconfiado, porém nunca
comentamos nada. Meu pai morava em Bali
e resolveu voltar para o Brasil. Ele e o namorado resolveram morar juntos e
para formalizar a união fizeram um almoço para a família (pais, filhos,
ex-mulher), isso foi em 2001.
2) Sua relação com ele mudou, se mudou, em que mudou?
2) Sua relação com ele mudou, se mudou, em que mudou?
Mudou e muito!!! Para melhor com certeza. Ficamos mais
amigos e com mais liberdade de conversar sobre qualquer assunto, inclusive
sobre o relacionamento dele.
3) Você conta para as pessoas, amigos, relacionamentos sobre o seu pai? Como conta?
3) Você conta para as pessoas, amigos, relacionamentos sobre o seu pai? Como conta?
A maioria dos meus amigos, que são realmente do meu
convívio diário, sabem sobre o meu pai. Não costumo comentar à toa com as
pessoas, mas se surge um assunto referente a gays acabo comentando Para mim
isso é totalmente normal!!!
4) O que você sente com relação a esse assunto?
Para mim é absolutamente normal. Meus pais são
separados há 30 anos. Eu tinha três meses quando se separaram. Cresci sem a
presença dele. Se eles tivessem se separado por causa disso, talvez eu pudesse
ter algum receio, mas como tudo isso aconteceu muito tempo depois, realmente
não me afetou em nada.
5) O que você diria para os “pais gays”?
5) O
Que cada um escolhe a sua maneira de ser
feliz...compartilhe da sua felicidade com as pessoas que você ama..
6) O que você diria para filhos de pais gays?
6) O que você diria para filhos de pais gays?
Não importa a opção sexual de seu pai; ele vai sempre
continuar sendo seu pai e te amando e querendo sempre o melhor para você. A
opção sexual não interfere em nada!!!
(*) Kátia Horpaczky
Psicóloga clinica, Sexualidade e Terapia de Casal
Kátia@rodadavida.com.br
Kátia@rodadavida.com.br