O luto é inevitável, saiba lidar com ele
(*) Katia Cristina
Horpaczky
A morte é a experiência mais angustiante que
passamos. Mais cedo ou mais tarde, iremos sofrer a perda de alguém próximo,
pode ser um amigo, um amor, um parente próximo. Na nossa cultura, falamos e
pensamos muito pouco acerca da morte. Por isso, não aprendemos a lidar com o
luto: como nos faz sentir, o que devemos fazer, o que é "normal"
acontecer - e de o aceitar.
Vou tentar aqui esclarecer algumas das
características principais do luto como, às vezes, podemos ficar presas a ele e
a ajuda que poderemos e deveremos procurar.
O luto é um processo que ocorre imediatamente
após a morte de alguém que amamos. Não é um sentimento único, mas sim um
conjunto de sentimentos e emoções que requer um tempo para serem digeridos e
resolvidos e que não pode ser apressado, cada um de nós tem um “tempo
emocional” que deve ser respeitado. Apesar de sermos indivíduos com
características próprias, a forma como vivenciamos o luto é muito semelhante na
maioria.
Enxurrada de emoções
Nas horas e dias seguintes à morte, a maioria
das pessoas passa pela fase da negação ou descrença, ficando totalmente
"atordoada", como se não pudesse acreditar no ocorrido. Mesmo quando
a morte era esperada, este sentimento pode surgir, mesmo que seja com menor
intensidade.
Este sentimento de torpor ou dormência
emocional, como se estivéssemos anestesiados, pode ajudar a levar a cabo todos
aqueles procedimentos burocráticos inerentes a este processo, mas pode
tornar-se num problema se continuar a subsistir. Ver o corpo da pessoa falecida
pode, para alguns, ser uma forma de começar a ultrapassar isto e começar a
superar a perda. Da mesma forma, para algumas pessoas, o velório e o enterro
podem ser situações onde a realidade começa a ser encarada. Apesar de ser
difícil lidar com estas situações, o fato é que elas constituem um modo de
dizer adeus àqueles que amamos. Estes acontecimentos podem parecer
demasiadamente dolorosos, mas o fato é que fugir a eles pode trazer problemas
mais tarde, muitas vezes, provocando um certo arrependimento.
Depois da fase de "negação", poderá
surgir um período de grande agitação, ansiedade
e ânsia pelo que foi perdido. Surge o sentimento de querer encontrar
essa pessoa seja de que maneira for, mesmo que tal seja impossível. Por isto,
nesta fase a pessoa começa a não conseguir relaxar ou a concentrar-se e o sono
pode ser muito agitado. Os sonhos que surgem nesta altura podem ser muito
confusos, pode surgir o medo de dormir sozinho ou no escuro.
Algumas pessoas chegam mesmo a
"ver" quem perderam, na rua, em casa. Com muita freqüência, a pessoa
em luto sente-se muito zangada e revoltada contra médicos e enfermeiros que não
conseguiram impedir a morte que agora lhe pesa, contra os amigos e familiares
que nunca deram o seu máximo. É comum também sentir raiva da pessoa que morreu,
que foi embora e assim a deixou, abandonou.
Culpa
Vamos falar de outro sentimento comum: a
culpa. Quando se perde alguém, é comum começarmos a pensar em tudo aquilo que
podia ter sido feito ou dito para aquela pessoa ou ainda o que podia ter feito
para impedir essa morte. Claro que a morte é um acontecimento que está além do
controle seja de quem for e a pessoa em luto deve ser lembrada disso o tempo
todo, se for necessário.
A culpa também pode surgir depois de se
sentir alívio pela morte de alguém que nos era muito querido, mas que sabíamos
estava a sofrer. Este sentimento é normal, compreensível e muito comum.
Essas fases podem ser seguidas rapidamente de
períodos de grande tristeza e depressão, retiro e silêncio. Estas mudanças
súbitas de emoções podem deixar amigos e familiares confusos, mas faz parte do
processo natural de luto. Crises de
choro e angústia intensa podem surgir a qualquer momento. Algumas pessoas podem
não conseguir perceber estas crises ou ficar sem saber o que fazer quando elas
acontecem. Poderá haver uma tendência da parte da pessoa em luto para evitar as
outras pessoas, mas isto pode trazer problemas futuros e, por isso, será melhor
que volte à sua "vida normal" o mais rapidamente possível. Durante
este período, pode parecer estranho aos outros que a pessoa em luto passe muito
tempo sentada, sem fazer nada, mas o fato é que ela estará a pensar em quem
perdeu, recordando constantemente os bons e maus períodos que passaram juntos.
Esta é uma fase silenciosa, mas essencial à resolução do luto.
À medida que o tempo passa, a angústia
intensa resultante do luto começa a desaparecer. A depressão atenua-se e será
possível, finalmente, começar a pensar em outros assuntos e até em novos
projetos. É importante salientar que o sentimento de perda nunca desaparecerá
por inteiro. Depois de algum tempo, deve ser possível sentir-se de novo
"completo", apesar de faltar sempre uma parte de si que nunca será
substituída. Quando sabemos disso e admitimos esse processo será menos
dolorido.
Como ajudar nesse momento?
A família e os amigos podem ajudar a pessoa
em luto passando um tempo com ela demonstrando que estão presentes para o que
for necessário neste período de dor e tristeza. É importante que a pessoa em
luto, se necessitar, tenha alguém com quem chorar e falar sobre a perda
sentida, sem que o “amigo” fique dizendo para se recompor e refazer a sua vida.
Nesse momento, o que ela precisa e falar e ser ouvida, pois o “falar” nessa fase
é “terapêutico”. Com o tempo, a pessoa em luto se restabelecerá, mas não antes
de ter chorado tudo, de ter falado sobre a pessoa e a perda.
Não devemos esquecer que datas importantes (o
dia do aniversário, do casamento, etc.) poderão ser particularmente difíceis de
reviver e pôr a pessoa em luto a participar ativamente na preparação de tais
celebrações poderá ajudá-la a não se sentir tão sozinha. É importante dar o
tempo necessário para que a pessoa em luto possa superar sua dor, pois de outra
forma poderá vir a ter problemas no futuro.
Ficar "preso" ao luto
Há pessoas
que parecem não passar pelo processo de luto, que não choram no velório ou no
funeral e até evitam falar da pessoa que perderam. São pessoas que voltam à sua
vida "normal" e retomam a rotina muito rapidamente. Esta pode ser sua
forma normal de lidar com a perda sem conseqüências negativas, mas outras
pessoas poderão, ao contrário, sofrer sintomas físicos e desencadear um
processo depressivo. Algumas pessoas podem não ter a oportunidade de passar
pelo processo de luto da melhor forma, uma vez que têm de continuar a sua vida
profissional ou familiar, não tendo tempo de “passar” pelo luto.
Algumas pessoas podem iniciar o processo de
luto, mas permanecer nele sem o resolver. Nestes casos, a dor e a angústia por
quem se perdeu mantêm-se e podem mesmo passar anos sem que a situação seja
realmente resolvida. Nestes casos, a pessoa pode continuar a não aceitar que
perdeu quem faleceu, mantendo-se na fase de descrença referida atrás ou, por
outro lado, só conseguir pensar em tal pessoa, mantendo, por exemplo, o quarto
da pessoa falecida intacto e como uma espécie de local de culto.
Ocasionalmente, a depressão que ocorre com
todo e qualquer luto pode agravar-se ao ponto de a pessoa deixar de se alimentar
e até pensar em suicídio. Em todos estes casos será obviamente necessária ajuda
profissional especializada.
Se você considera que pode estar em risco de
sofrer desta incapacidade de resolução do luto, ou conhecer alguém que pode
estar nesta situação e considera importante partilhar isso com alguém exterior
a família ou amigos, pode buscar auxilio de um profissional, de um psicólogo
para superar essa fase.
(*) Katia Cristina
Horpaczky
Psicóloga clinica
CRP
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